terça-feira, 30 de dezembro de 2014

PRECE DE 31 DE DEZEMBRO




Iemanjá
Nossa Senhora do Mar
que estás em Ipanema Iracema
Samanguaiá Olho d'Água São José de Ribamar
e no fundo daqueles que têm o oceano
escondido nos olhos
Santificada sejas
em terra e ar
Hoje é 31 de dezembro
À noite o povo vai se embriagar
e descer para as tuas praias
(até aí tudo bem
que um traguinho de pinga
não faz mal a ninguém)
Vão se banhar todos os pescadores:
os invejosos os egoístas os deslumbrados
os fratricidas os e cara lavada
num grane banho coletivo
(lavar as impurezas do corpo
e da alma
acumuladas em 365 dias de sujeira)
E esse sujo radioativo
que polui e contamina
pra onde vai?
Teu reino
nas profundezas do mar


Aproveita o período de festas de fim de ano
tira umas férias
Vai para uma ilha distante
uma praia deserta
onde não haja banhistas e surfistas
e esquece a humanidade inteira
(é preferível um lugar
que não conste no mapa-múndi
nem na geografia celeste)
Dia 1o. de janeiro
depois que o mar normalizar
e as ondas expulsarem para a praia
o breu dos pecados
A Senhora retorna
com um vestido novo
decorado de estrelas
conchas e búzios
e fica conosco
até o fim do ano
até o fim da vida
aqui no Araçagi
(exceção feita 
em 31 de dezembro)


                                           Amém







Luís Augusto Cassas
In A Poesia Sou Eu, vol. 1, p. 110





terça-feira, 23 de dezembro de 2014

ÁRVORE ACESA






Invente novo ritual
para os dias que correm


Seu corpo é uma árvore
resistente a bombardeios
violações apocalipses explosões


(onde crianças e pássaros
bebem o néctar das manhãs)


Agora gire os braços
e acenda o seu clarão


Você é uma estrela acesa
iluminando a escuridão





Luís Augusto Cassas
Poema Inédito







quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

BOLETIM METEOROLÓGICO-SENTIMENTAL DE 25 DE DEZEMBRO





Tempo bom
temperatura estável
em quase todos os corações
Visibilidade ampla:
nas vitrines das lojas
nos vitrais das casas
nos para-brisas dos carros
nas lentes dos óculos



Temperatura em franca elevação
no São Francisco e em outros bairros da cidade
O champanha francês servido a 12 graus
o uísque escocês sorvido a 43 graus
o peru assado a 150 graus
Foguetes e risos explodindo/nozes
e abraços repartidos/
(Euforia subindo no termômetro
em níveis não registrados)



Temperatura agora em declínio
com lufadas de ventos frios
vindos das bandas da baía de São Marcos



O menor abandonado que dormiu
na manjedoura do banco da Praça Pedro II
passeia miséria e tristeza pela Rua Grande



Vê manequins vestidos/brinquedos eletrônicos/
e sente que seu Cristo não nascerá jamais
(Ele está crucificado na Igreja do Carmo)



Temperatura baixando
Nuvens espessas se formando
nos olhos do menino



Temperatura caindo ainda mais



Em São Luís do Maranhão
está chovendo






Luís Augusto Cassas
In A Poesia Sou Eu, vol. 1, p. 113



Praça Maria Aragão
São Luis - MA






sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

AQUA PRO NOBIS





de áries a aquário
em pleno martírio
somos todos peixes
árido santuário
queimando em círios



tudo o que cultivar
o amor e o mar
dirá ao mar: abre-te!
e qual afiado sabre
o amar  se abrirá!



diz-me senhora:
o que te inunda as órbitas
desrepresa os seios
e resseca a flora? 
_ o mar também chora!



da onda da discórdia
darei trégua à mágoa
mas quem blasfemar
contra o reino da água
não terei misericórdia



horas de Urano
lembrai-vos de Sara
fecundou-a  um rio
e irrigou o Saara
de nos infortúnios!



louco stradivarius
tua nota úmida
povoe o relicário:
um aquário sem peixes
não é santuário








Luís Augusto Cassas
In A Poesia Sou Eu, vol. 2, p. 270






segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

TAO À MILANESA



Monja Coen


Cassas, Luís Augusto



Vieram lágrimas e sorrisos
escondidos e transparentes
Nas suas palavras lentes
o Caminho se revela
transgredindo a transgressão
Linguagem revoluciona a mente
completa a  oferta da serpente
tentação de seguir em frente


Eu não sei fazer poemas
Eles me fazem
Então leio você e vejo você
Aqui comigo
Conversamos, choramos, rimos


Tudo passa e acontece 
no Zazen
Sentados em aparente silêncio
Ouvimos os tormentos internos
memórias
esquecimentos
relatos de uma existência


Quanto movimento!
Corpo-mente parados
extáticos
tática Zazen
percebendo o imperceptível
vaivém


Lindo você
que reconheço
no Tao à Milanesa


gassho
coen






Monja Coen
Poema Inédito
In A Poesia Sou Eu, vol.2, p. 623








Tao à Milanesa é um dos quatro livros inéditos
da poesia reunida de Luís Augusto Cassas
 A Poesia Sou Eu, vols.  1 e 2




                                            
                       









Monja Coen é professora de monges e leigos  
dentro da tradicional escola Budista Soto Zen 
do Japão  (fundada no Século XIII),  
é atualmente (2009) a presidente do Conselho
Superior  da Comunidade Budista Soto Zenshu
da América do Sul  e líder espiritual do Templo
Busshinji de São Paulo,  aonde ocupa
também a posição de missionária oficial
enviada pela Sede Administrativa do Japão. 


http://www.monjacoen.com.br/