segunda-feira, 24 de novembro de 2014

OFÍCIO CÓSMICO





desde a cruz do início
atraíste-me ao círculo
teu divino ofício


foste/és meu solstício
ciência e abismo
sol flor dentifrício


planeta em comício
ferido no infinito
eis-me a teu serviço


pregado em martírio
na láctea via crucis
sou o teu crucifixo









Luís Augusto Cassas
In A Poesia Sou Eu, vol. 2




quarta-feira, 19 de novembro de 2014

O ANJO EXTERMINADOR




poeta é quem estilhaça
horizontes
dinamitando (atrás de si)
as pontes



e inaugura  beleza
nos cataclismos
colhendo a pura rosa
dos abismos








Luís Augusto Cassas
In A Poesia Sou Eu, vol. 2, p. 451






segunda-feira, 10 de novembro de 2014

GIOTTO






             Em 1997, o cantor e compositor Chico Maranhão lançou o CD São João, Paixão e Carnaval pela Cedro Music. Uma das faixas desse CD é a música intitulada ‘Giotto’, composta em homenagem  ao poeta Luís Augusto Cassas e sua obra ‘A Paixão Segundo Alcântara’.

         
      Livro publicado em 1985 e reeditado em 2006 com novos poemas, ‘A Paixão Segundo Alcântara’, é um cântico poético e profético  de raro esplendor lírico, cuja ressonância ainda ecoa nos dias de hoje.
    Uma obra que se mantém vívida em poesia e lirismo, sob os traços de Luís Augusto Cassas,  cujas matizes  de sombra se refletem no teor de denúncia que o livro abriga, quando da instalação da base de lançamentos de Alcântara.
     Hoje, a cidade, certamente, não é a mesma, mas sua beleza e singularidade permanecerão salvaguardadas  sob a égide dos versos alquímicos desse poeta em seu livro. 


            Giotto  é, portanto, o eco sonoro dessa poesia, magistralmente reinventada ( ou decodificada) na canção de Chico Maranhão, que, com sua sensibilidade musical, tem a inspiração tocada pela poesia de Cassas, cujo resultado é a fusão  de obra e poeta em canção única, reverberando a beleza e a autenticidade que só a arte com a arte conseguem refletir.  





Clique e ouça a música


GIOTTO
                                          

É o bicho-homem
conquistando os espaços
com suas virgens
com seus giottos
com suas viagens de luz
o tempo todo

É o bicho homem
navegando nas estrelas
com suas antenas
com seus planetas
com suas bandeiras de nylon
seus poemas

É o bicho homem
nas alvoradas de Alcântara
procurando  ver se encontrará
a sua parte
o seu perfil
há de encontrar
há de encontrar
há de encontrar


é o bicho-homem
de  Luís Augusto Cassas
fustigando  nas vidraças
a paixão segundo ele viu
são  as caixeiras
são  as caixeiras
do  Rei Brasil

é o bicho homem
nas alvoradas de Alcântara
procurando ver se encontrará
a sua parte
o seu perfil
há de encontrar
há de encontrar
há de encontrar




 Chico Maranhão
em homenagem a Luís Augusto Cassas







terça-feira, 4 de novembro de 2014

LIRA EM DELÍRIO (O Poeta Comemora 40 anos & troca In-Confidências com a Sombra no Espelho)

Gonçalves Dias



meu caro bibliófilo:
estranho hieróglifo
traduz meu jardim


meus lábios estanques
colhem rosas de sangue
e anunciam o fim


comédia do destino
os pulmões em desatino
sopram oxigênio ruim


crepúsculo-catarro
forja negro pigarro
à odisseia-chinfrim


frágil garganta canta
pássaro sem esperança
melodia-caim


faltam-me estima e rima
pra lutar contra a sina
e dizer à vida: sim!


náufrago o amor
resta-me o ágio de dor
que sustenta-me o rim


nem o melhor biotônico
salvará o lado ôntico:
bastardo-serafim


sou um fantasma romântico
em pesadelo crônico
cozinhando o seu cauim


(ó verdade eterna:
o amor é romântico
mas a dor é moderna!)


deus permita que o lírio
que destila do delírio
acenda tristes cílios


no jardim que me empesta
solto as últimas pétalas
o sangue que me resta


cumpri o destino de bardo:
amei a dor e a saudade
em vossa piedade ardo


quando chegar ao paraíso
direi: fui feliz
com dor e nenhum motivo








Luís Augusto Cassas
In A Poesia Sou Eu, vol. 1, p. 604