A Poesia Sou Eu, vols. 1 e 2
Poderíamos
dar início a este ensaio afirmando que o Maranhão é uma ilha cercada de poetas
por todos os lados. Se é exercício ocioso enumerar todos os que
competentemente têm feito
da fascinante e áspera luta com as palavras o seu pão
estético de cada dia e a ração diária de uma sobrevivência que se espraia para
além da ritualizada rotinização comportamental cotidiana, poderíamos, assim
mesmo, lembrar a densidade ontológico-metafísico-existencial que imanentiza o
luminoso e corrosivo imaginário poético de Nauro Machado; a fecundidade
rítmico-imagística de Arlete Nogueira da Cruz, notadamente a que se delineia na
sua belíssima Litania da
Velha; o
telurismo impregnado de elevado pathos humano de certo viés
apolineamente celebratório da poética de José Chagas; o cotidiano
magistralmente transfigurado por Ferreira Gullar em Muitas Vozes, dentre outros que integram o
qualificado código onomástico que compõe a cartografia lírica da iluminada
ilha.
Agora,
prosseguindo essa rica tradição de brilhantes artesãos da palavra poética em
suas múltiplas direções, já tendo obtido crescente e consagradora recepção da
crítica literária especializada brasileira, surge Luís Augusto Cassas, cuja
poética caleidoscópica, estranha e delirantemente visionária se tem constituído
como um dos mais bem realizados projetos literários de nossa lírica
contemporânea.
Considero
caleidoscópica a cartografia poética
engendrada por Luís Augusto
Cassas porque, recusando-se, criativamente, a se enquadrar de forma passiva
nesta ou naquela vertente estético-filosófica, sua poesia, portando
exacerbada sede de
eternidade e ânsia
de infinito, transcende, pelo
alto poder transfigurador de que se reveste, as gramáticas mais rígidas e
convencionais das elaborações epistemológicas mais previsíveis e, guiada por
uma peculiaríssima e transgressora lógica que rompe os interditos, venham eles
de onde vierem, propõe, universal e transdialeticamente, uma
espécie de holística
compreensão da realidade;
atravessada por uma
visceralmente dramática compreensão
do universo, através de um vertical incursionamento pelas camadas mais
abismais da sua significativa e errante personagem histórica, e protagonista
maior: o homem, com os seus desafiadores enigmas e encantatórios sortilégios.
Significativa,
porque é a partir do horizonte de expectativas gestado pelo
ser humano que
tudo, a materialidade
objetiva do mundo circundante e os abismos da interioridade subjetiva, ganha o desafiador estatuto
e emblemático contorno de uma
enigmática esfinge que gera e produz
significações (in)decifráveis; errante, porque a travessia humana, em
suas mais variadas
peripécias, se tem
nuclearizado pelo indeclinável sentimento
de uma permanente
busca; uma incansável procura pela utopia plenificadora;
por fim, histórica, por ser no palco impuro
da história que
as intersubjetivas relações
humanas se constroem, ora eufórica, ora disforicamente.
Dir-se-ia
que o pensamento complexo, hoje tornado leitmotiv
privilegiado em quase todas as reflexões engendradas pela ciência e pelas
diversas formas de manifestação do conhecimento, encontra na poesia de Luís
Augusto Cassas uma ostensivamente visível ressonância.
A
universalidade do projeto poético gestado pela febricitante imaginação poética
de Luís Augusto Cassas provém do fato de que, se por um lado, é das motivações
produzidas pela territorialidade geográfica de São Luís que emerge o seu
fabulário multiestratificado, por outro, o recorte telúrico, reordenado por
níveis crescentes de acendrada fantasia, é apenas ponto de partida, nunca de
chegada, de um transmanente voo poético na busca constante da totalidade das
coisas, dos seres, dos fenômenos, da linguagem, da poesia; enfim, de tudo o que
compõe o vasto e heteróclito repertório da plural e cósmica existencialidade
humana.
Já a
transdialeticidade, de que o imaginário
poético de Luís Augusto Cassas se
nutre, na compacta
corporeidade de cada
verso inventado, com a cumplicidade vigilante da
tessitura afetiva dos seus ritmos
e imagens, e da tonalidade situada nas estésicas fronteiras entre o
lúdico-epifânico e o
profético-apocalíptico, sinaliza para uma espécie de núcleo ideativo de base
ostensivamente holística, que, escavando o universo através de uma mítica
memória ancestral do ser, recusa as dicotomias empobrecedoras e o binarismo
previsível das leituras reducionistas e setorizadas da realidade.
Aventura irreprimível
da liberdade criadora, a poesia mobilizada e posta em cena por Luís Augusto
Cassas, ancorando-se no porto mágico de uma espiral infinita de sentidos, é uma
movediça arquitetura semântica que a si mesma se (des)classifica do
ponto de vista
de um enquadramento
genológico unidimensional, rebelando-se
contra os rótulos e etiquetas por
vezes postos por uma crítica sistêmica, incapaz, diria Eduardo Portella, de
ouvir a voz do silêncio ou perceber, mesmo minimamente, os
sentidos que ultrapassam
as enganosas estruturas imanentes à superfície textual, e
se vão agasalhar nos subterrâneos simbólicos potencializados pela energia
entretextual da poesia.
Com República dos Becos, livro inaugural do seu já
diversificado espólio poético, Luís Augusto Cassas, atentíssimo às lições da modernidade
literária, nos põe em contato com uma poesia que se vai desentranhando nos
bastidores mais miúdos de um cotidiano aparentemente desimportante, mas que,
iluminado pelas poderosas lentes de ziguezagueante lírica, revela-se denso e
prenhe de ricas significações humanas.
Livro
marcado por uma dicção ostensivamente mesclada, acumpliciando o solene e o
prosaico, o profano e o sagrado, o físico e o metafísico, tudo atravessado por
um vigoroso e cortante sopro irônico, visionário e social, República dos Becos já se vai constituir numa
espécie de súmula daquilo que o inquieto autor maranhense iria criar no
território mágico da poesia.
De acordo
com o teórico francês Alan Viala, o livro inaugural de um determinado escritor
reveste-se, no conjunto totalizador da sua criação, de grande importância,
visto que, nele, se presentificam aquelas matrizes
temático-estilístico-conceituais responsáveis e garantidoras da mundividência
desse mesmo escritor.
E, se é
fato que os escritores se repetem, não em decorrência de monotonia criadora ou
fragilidade imaginativa, mas sim em obediência aos impulsos e obsessões
fantasmáticos que lhes habitam o interior, aqui, nessa república inventada por
Luís Augusto Cassas, de cada beco rastreado evola-se, prometeicamente, o
humano-sagrado fogo da poesia,
revolucionária poesia, “revelação e expansão
do ser sensível”, no lúcido dizer do
mestre Josué Montello.
A
realidade cultural que imanta toda a produção poética de Luís Augusto Cassas é
a que se cartografa e se circunscreve aos limites ilimitados da sua mítica
cidade natal: a Ilha de São Luís. O paradoxo tem a sua íntima razão de ser.
Toda cidade é, ao mesmo tempo, o mundo, com a sua ostensiva universalidade, e a
província, com os seus fantasmas e as suas inevitáveis formas de opressão.
Cosmopolitismo e localismo se dialetizam numa tessitura que fascina e repele;
encanta e fere; celebra e denuncia, numa serpentinática tecelagem dos
contrários.
Romeira
da esperança e peregrina do mundo, a poesia de Cassas é mítica e mística, terna
e debochada, anárquica e solar; profundamente solar, capaz de, utopicamente,
sonhar com outra realidade, mas sem perder
o bonde da história, matizar-se, também, de um viés profético mais que
competente em cifrar e decifrar os enigmas do tempo: os amoráveis fantasmas do
passado, os impasses do presente e as incertezas do futuro. Poeta e poesia, em
tempos de alucinação e espera, como diria Carlos Drummond de Andrade, fundem-se
nas aporias de um mundo que, exacerbada a degradação nos mais diversos níveis,
nem mesmo se pode mais dizer “meu
Deus”, porque
a vida transmuta-se em “pura ordem
e impura mistificação”.
Depois de
República
dos Becos, Cassas,
dando forma, cor, luz e sombra ao seu acendrado recorte telúrico, espalhado em
toda a sua obra poética, mergulha
no imaginário da
cidade, cantando, em A Paixão Segundo Alcântara e Novos
Poemas, as
faces, disfarces e contrafaces de um projeto de progresso predatório e reificador
do humano.
A
Paixão Segundo Alcântara e Novos Poemas (Imago-RJ-2006) trilha esta travessia que, ancorada em
tonalidade ostensivamente profética, debruça-se sobre a cidade de Alcântara
e dela
retira a seiva de que
se alimenta o
seu visionarismo densamente
contestador de uma ordem que se lhe afigura injusta e contrária
a um projeto de plenificação humana e cidadania integral.
Mais que uma geografia
exterior, a cidade
é um lugar
em que, conforme escreveu Jorge
Luís Borges em O Fervor de
Buenos Aires, arde e
se consome, consumando-se, o espírito dos homens. Projeção lírica e canto
épico, a cidade é, também, palco de tragédias e comédias que dão fisionomia ao
multívoco espetáculo humano.
Sobremaneira
elucidativas são as palavras de Jose Americo Costa, que, ao prefaciar o livro
de Cassas, assim se pronunciou: “De fato, quem conhece de perto o drama de Alcântara e do seu povo
tem consciência do choque cultural, geográfico e econômico que a ciência do
círculo fechado e a tecnologia sem transcendência provocaram na cidade e nos
seus habitantes. Por ocasião da instalação da base de lançamentos, cerca de 312
famílias de 32
povoados foram deslocadas
de suas comunidades
para agrovilas, por determinação
do Ministério da
Aeronáutica. Longe das suas
terras férteis e sem acesso aos recursos naturais, foram obrigadas, a partir de
então, a usar identificação liberada pelo Centro de Lançamento de Alcântara
para ter acesso à pesca e, portanto, à sobrevivência”.
De acordo
com a ensaísta paraibana Elizabeth Marinheiro, “Para a escrita da modernidade, a cidade é um motivo relevante.
Com ela, enquanto espaço geográfico e textual, surge a supervalorização do cotidiano”. Cotidiano que, sob os
auspícios dos irreversíveis impactos do progresso predatório, facilmente
resvala no território corrosivo da desumanização.
Se o
poeta, conforme as lúcidas lições do mestre Alfredo Bosi, “é um doador de sentidos”, Cassas encarna,
brilhantemente, este perfil, nesta bela e sofrida paixão alcantarense, ao
percorrer a alma da cidade, sondar-lhe o angustiado estado de espírito e, sobretudo,
captar-lhe a voz transida e matizada pelo áspero e necessário sentimento da
resistência. Resistência impotente, é verdade, diante da “força da grana que ergue e destrói
coisas belas”, como
diria Caetano Veloso, mas que ainda é capaz de deixar, pelos caminhos regados
com o dilúvio das lágrimas, os indeléveis vestígios de uma humanidade possível
(Poema dos Olhos de Alcântara).
Humanidade
que não troque o canto romântico dos sabiás pelo ranger mortífero dos mísseis.
Não troque a contemplação desinteressada das estrelas pela cupidez insaciável
das especulações mercadológicas. Nem presuma, como autêntica vocação suicida,
que a construção do imprevisível futuro somente pode se efetivar com a
argamassa dos escombros do passado.
Intimismo
lírico e celebração pública, a prosa poética que percorre o solar livro de Luís
Augusto Cassas, na parte intitulada Um Peixe Fala aos Homens, segue o mesmo diapasão denunciatório anteriormente exposto. Aqui, a voz lírica enunciada promove a defesa
da natureza arruinada e enfrenta, com desassombro, o pragmatismo triunfante de uma
modernidade trituradora dos mais comezinhos valores humanos.
De A Paixão Segundo Alcântara, a poesia de Luís Augusto
Cassas desemboca na tonalidade ostensivamente niilista e contracultural de Rosebud. Impregnada das sombras de uma
ácida revolta contra o mundo, não raro facilmente metamorfoseada em ódio, a
alma do poeta se ensombrece, e a sua poesia transforma-se em um verdadeiro grito
contra os descalabros do mundo. Grito
matizado pelo mais visceral sentimento de angústia, dado que, aqui, vê-se,
claramente, ser a poesia impotente para promover a sempre perseguida, e adiada,
utopia da transformação planetária.
Rosebud é um livro forte, que não se
lê impunemente. Nele, promovendo uma espécie de impiedosa catarse da alma, o
poeta põe em cena, também, questões que dizem respeito ao próprio papel da arte
e do artista no enfermo mundo contemporâneo.
Discorrendo
sobre a poesia do paulistano Roberto Piva, o ensaísta Carlos Felipe Moisés,
a certa
altura do seu
arrazoado, afirmou que “O texto que ali está, no papel, pode ser encarado como uma
espécie de partitura, representação provisória das potencialidades de uma voz,
ou vozes, que esperam ganhar existência efetiva, sopradas no ar de fora, em vez
de serem moduladas pelo ouvido interior, intelecto adentro. Para isso, é
preciso que o leitor se faça ouvinte. Mediada pela leitura silenciosa, a oralidade
básica da poesia de Piva, com seu intenso poder de canto, passará despercebida.
Ou continuará sendo só promessa, latência”.
A
despeito das diferenças substanciais que separam as poéticas de Luís Augusto
Cassas e Roberto Piva, creio que a asserção de Carlos Felipe Moisés, no tocante
ao estrato melopeico que essencializa o verbo
estético do autor paulistano, é perfeitamente cabível, se aplicada ao livro
Rosebud, de autoria do maranhense Luís Augusto Cassas.
É como
se, no lugar da palavra impressa, impregnada de silêncios e feita para ser
apreciada no recolhimento da alcova ou de confortáveis gabinetes, Cassas
tivesse optado pelo discurso pronto para ser rugido na praça pública, cuja voz
tonitruante fosse minimamente capaz de acordar os homens da letargia em que se
acham mergulhados. Daí, a meu ver, impregnar-se o livro de uma configuração
dramática, como se os poemas que o enfeixam devessem ser recitados, encenados,
vivenciados com todas as dimensões constitutivas da corporalidade humana, e
nãoapenas consumidos, individual e solitariamente.
Rosebud é um livro marcado, em toda a
sua estilhaçada estruturação interna, pelo doloroso sentimento da crise por que
passou o poeta, não somente em relação à funcionalidade do fazer estético, como
também ao próprio sentido da existência. Nesse livro corrosivo e dramaticamente
confessional, Luís Augusto Cassas, paradoxalmente, declara seu amor e seu ódio
por tudo quanto o cerca, inclusive pela poesia, sua amante mais dissimulada e
companheira mais perseverante e resistente.
Fundamental
na poesia de Luís Augusto Cassas, Rosebud
se constituiu no livro do impasse e da transição para outros itinerários
poéticos e existenciais; e, de igual modo, da fenda que se abriu para a
ultrapassagem do poeta em direção a uma abertura espiritual que o reconciliou com
o mundo, com a poesia, com a existência e consigo mesmo.
Rosebud, penso, pode ser definido como
um mergulho no abismo e um voo à procura do infinito. Dessa batalha do poeta com as suas
inquietações mais devastadoras, surgiu um novo
canto e uma
nova melodia, que não
ignora os descompassos
e as dissonâncias
da realidade, mas não desiste,
nunca, de tentar encontrar o tom mais adequado para a celebração da bela
sinfonia da existência. E foi exatamente isso o que fez Luís Augusto Cassas em
sua produção posterior, que, iniciada com O Retorno da Aura, foi seguida por Liturgia da Paixão, Ópera
Barroca, O Shopping de Deus, Bhagavad Brita — A Canção do Beco, dentre outros que, juntos,
compõem uma das mais originais vozes da lírica brasileira da atualidade.
Secreta
via de um originalíssimo itinerário mental, como o que aflora do fremente
diálogo travado entre discípulo e mestre no estuário semântico do inquietante Bhagavad - Brita — A Canção do
Beco, a ascese
por que passa o discípulo em busca da iluminação de sua consciência segue a
estranheza dos roteiros incomuns que, ao fim e ao cabo, podem levar ao bem
supremo, exatamente a que tem na escorregadia unidade de todas coisas
o seu estuário
primordial. Mas, sem a frieza glacial
da tirania racionalista; antes, com a orquestração consorciada e harmônica de
todas as dimensões que essencializam o complexo plural a que, na falta de
melhor rótulo, chamamos de ser humano, cuja maior dificuldade, diria o sinuoso
narrador de Clarice Lispector nas asas do seu selvagem coração, é ser humano.
No Sermão do Beco, pregado em
três sincronizados tempos,
a pedagogia existencial emanada, em cujo interior consorciam-se
tecelagem barroca e acendrado panteísmo cósmico, conflui, uma vez mais, para a
única conversão em que acredita o poeta, e que se depreende da sua fusionista
cosmovisão: o correlacionamento Sujeito versus
Objeto; a indissolubilidade entre Deus e o homem; entre a materialidade
concreta das raízes da terra e a diafaneidade azul do cromatismo celestial;
entre a treva, contraface do bem, e a luminosidade, por vezes disfarce do mal.
Nesse
sermão, cuja profissão de fé e credo mais acalentado tem na percepção
totalizadora da existência o seu paradigma comportamental predileto e parâmetro
axiológico inafastável, a bênção maior é a reconciliação do homem com a ordem cósmica de
que ele emergiu
e para onde voltará, de
acordo com a opção transdialética do
multifacetado eu-lírico que Luís Augusto Cassas construiu e fez circular
na sedutora diegese lírica que inventou com tanto rigor estilístico
e tão arraigado centramento na
vitalíssima escola da
experiência; verdadeiro ponto final do seu obsessivo evangelho
integratório, no qual “Deus e
a matéria são uma coisa só”.
Repelindo
enfaticamente qualquer ranço dogmático,
seja ele de inspiração física ou metafísica, a poética
transmanente de Luís Augusto Cassas, consoante o belíssimo “Agradecimento Final do Discípulo
Depois da Iluminação com Pedrada no Cocuruto”, propõe o desvendamento do ontológico mistério do ser,
como algo a ser obtido como resultado não de uma epifania episódica e
circunstancial, tragada pela desoladora finitude de um tempo fragmentário
porque aprisionado pelo mero transcorrer inflexível das horas, mas sim pela
recorrente e obstinada travessia do caminhar de todos os instantes, “esvaziando-se o cheio e enchendo-se o
vazio”, até o
atingimento totalizador da sábia lição do beco: tornar o poeta, e a tantos
quantos lhe espreitam o labiríntico roteiro, a imagem e a semelhança do
coração, território confluente dos mais díspares e às vezes aparentemente
inconciliáveis sentimentos.
Sinfonia
de uma procura existencial imanentizada por uma, convém reiterar, irrefreável
sede de eternidade e ânsia de infinito, flagradas ambas pelo poeta em cada espetáculo
do cotidiano, mesmo nos aparentemente prosaicos e intranscendentes, a
música final do concerto polifônico do Bhagavad-Brita — A Canção do Beco, com a sua intencionalíssima
exortação conclusiva, quer atingir o cerne do ser e, enfim, cumprir a sua alta
missão de poesia que, conjugando admiravelmente a inalterabilidade do verso com
a inesgotabilidade da imagem e a vertical profundidade de um pensamento
radicalmente transgressor porque corajosamente
contraideológico, como diria
o semiólogo português Salvato Trigo: “perfurando o hímen
da palavra, produz o gozo estético da expressão”.
Migramos
do cais da polimórfica canção do beco e desembarcamos, uma vez mais, no porto
do sagrado, em cujo espaço destituído da indiferenciação homogeneizadora de
valores e percepções, de acordo com as postulações conceituais
de Mircea Eliade,
emerge, triunfalmente, O Retorno da Aura, protagonizado por Luís
Augusto Cassas, não na busca modista e ridiculamente burguesa das paisagens
exteriores e macrocósmicas, precário roteiro que às vezes nem consegue
disfarçar, como diria Caetano Veloso, a condição de avesso, de avesso, de avesso
do velho consumismo estéril, em cujas águas turvas a cidadania e o cultivo da
subjetividade são tragados pelas demoníacas engrenagens da ilusão.
A aura, recuperada por Luís Augusto
Cassas na encantatória magia verbal do seu febril e
incontrolável imaginário poético, não está situada em Jerusalém, Meca, ou
qualquer outra mítico-mística geografia planetária, mas sim na difícil odisseia
de volta do ser humano para dentro de si mesmo; no exigente pacto ético de
polimento do próprio coração, para que ele, enfim, translúcido como um espelho,
converta-se num palco sereno em que a vida possa desabrochar com a força
soberana de sua celebratória plenitude.
Promovendo
a interpenetração dos contrários e,
mais que isso, desconstruindo falsos dualismos, a
poética de Luís Augusto Cassas, “aos pés do cosmos”,
faz contracenar, na mesma tessitura sígnica, o sagrado e o profano, face e
contraface de um mesmo espetáculo humano, ancestral e jovem, sórdido e sublime,
vulgar e solene, em cujo âmago nada há de novo sobre o solo, senão o ingente
percurso da busca e a alucinante procura da aura, entre outras coisas, “ora escurecida na perda do amor pelo
prazer, ora vilipendiada pelo elogio do ressentimento em lugar do perdão, ora
obscurecida pela cobiça em vez do desapego e fragmentada pelas ideologias de
falsos profetas e poetas”.
Na
poética de Luís Augusto Cassas, penalizado qualquer ludismo gratuito e
inconsequente; repelido qualquer retoricismo vazio e esteticamente
inconsistente, porque desprovido da verdade humana essencial, atributo
inafastável de qualquer obra de arte que se preza, há uma alta e assumida
consciência de missão ética, para além de qualquer filigrana de ordem estilística
ou propriamente genológica.
É que,
radicalizando as relações entre a vida e a arte, como fizeram os
arautos da desreprimida
poética romântica com a excentricidade contracultural dos seus
profetas, loucos, visionários e dândis, Luís Augusto Cassas, trazendo
no peito o fogo que Prometeu roubou dos deuses e doou aos
homens, num visceral gesto de comprometimento com a liberdade,
compreende a poesia como a mais revolucionária de todas as
artes, daí, “entre um corpo e outro
corpo, entre um espírito e outro espírito, o poeta, que cultiva a
humildade não com devoção, mas com
drummondiano
constrangimento, e que
nasceu em São
Luís do Maranhão onde, segundo ele,
o vento faz a curva e a ilha é a parada final de urubus e aviões”, bradar, com a força
inexpugnável das suas convicções
ético-estético-existenciais,
as jupiterianas verdades
do seu credo e apostolado transdialético e
transpoético. No limite, mais que divino, porque humano, demasiadamente humano.
Do Retorno da Aura, e das suas fecundas
transmutações e alquimias densamente transfiguradoras, rumamos, com os olhos
embriagados de imagens e a alma encharcada de poesia por todos os lados, para o
mais que envolvente território da paixão e sua indisciplinada liturgia, em cujo
epicentro, o amor a Deus, à vida, a si mesmo, à mulher amada; enfim, a tudo o
que integra o vasto da existência, paira, soberano, como a mola propulsora da
vida em suas plurifacetadas dimensões.
Precedida
paratextualmente de um luminoso prefácio, a liturgia passional a que Luís
Augusto Cassas se entrega com a ostensivamente visível volúpia dos
santos e dos
místicos, nada tem
de idealista nem de
ingênua; antes, tem
a consciência nítida
dos interditos que
intentam obstaculizar a transmanência do voo humano em busca da
plenitude, mas, mesmo assim, se nutre do desejo maior, único pastor de sua
humano-divina ascese, que é, nas asas e nas garras do amor, “descobrir o paradoxo de todos os
mistérios e desnudar o paradoxo de todos os fracassos”.
A Liturgia da Paixão, cartografada
multidirecionalmente por Luís Augusto Cassas, para além das sombras que a
espreitam e contra ela conspiram, renova
a profissão de
fé no homem
e, mais que isso, faz do espírito o esconderijo mais privilegiado
da esperança; e, da esperança, o
antídoto mais seguro contra
os volumosos caudais de desespero que ameaçam subjugar não
somente a arte, mas a todo e qualquer projeto civilizatório gestado nos
incertos tempos do aqui e do agora, nos arraiais da pós-modernidade
relativizadora de tudo e de todos.
O amor,
orficamente celebrado por Luís Augusto Cassas, recusa as bem arquitetadas
algaravias de inúteis e desnecessariamente complexas elucubrações mentais, para
ser flagrado, com a conspiração de todos os sentidos, no “centro da folha branca”, onde o mistério luminoso da
poesia, com a sua insaciável fome e sede de infinito, paradoxalmente se
desentranha das mais prosaicas e aparentemente desimportantes cenas do
cotidiano.
Temos,
como exemplo, a matemática caseira do lavar os pratos, o diálogo com as
formigas, o brincar com as crianças, a alface que se prepara para a salada e,
por fim, o bom-dia dado à mangueira, gestos que, lembrando um pouco a
objetivista poética caeiriana, conferem ao caleidoscópico olhar do poeta
maranhense a nitidez e primitividade de quem, litúrgica e permanentemente posto
em estésico estado de paixão e
êxtase, quer recuperar
o mundo em sua (im)possível e
virginal intocabilidade e, mais que isso, com ele, nas asas de acendrada
paixão litúrgica, assinar, racional e intuitivamente, um pacto de perene e
poética comunhão.
Na
apaixonada liturgia amorosa protagonizada por Luís Augusto Cassas, há também espaço para
a corrosiva e afiada
“faca só lâmina” de uma lírica que não suporta
a teatralidade inautêntica de uma Alta Sociedade que tem nas atitudes postiças
e no culto espúrio à cartografia dos simulacros o seu paradigma comportamental
predileto.
A amorosa
e passional liturgia inventada por Luís Augusto Cassas, ao mesmo tempo que
propõe a comunhão universal de tudo com todos, reconhece, com pungente
consciência, que o roteiro traçado para a convivência do eu com o outro é
espaço do atrito que fere, do conflito que esmaga e da fratura que mata.
Sabe
também, com Eduardo Portella, que, se, por um lado, “somos um ser para o outro e fora do
diálogo o que existe é o precipício”; por outro, não ignora que a verdadeira “coroa de espinhos é amar o próximo ainda
que distante”, daí
a cortante e
paródica sentença final da pungente oração do Poema da Vã Glória ou Da Glória Vã: “Crucifica o próximo / Senhor / Crucifica-me
junto com o outro / pra ver se o suporto no paraíso”.
Promovendo
magistralmente o acumpliciamento dos contrários e a fusão dos mais
aparentemente inconciliáveis paradoxos, a liturgia passional de Luís Augusto
Cassas celebra ardentemente o amor e, mais que isso, busca, através dele,
restaurar a primitiva unidade de todas as coisas.
Da
Liturgia da Paixão transportamo-nos para uma Ópera Barroca, na qual, transitando do escárnio para o maldizer, numa
espécie de revivescência moderna da jocosa, não raro escrachada, poética
contestatória dos trovadores medievais,
Luís Augusto Cassas, ancorando-se no hegemônico motivo da cidade,
centralíssimo nas poéticas da contemporaneidade, canta, às
avessas, a Ilha
de São Luís, pondo em evidência, numa mesma cena lírica, ora as suas
grandezas, ora o caráter predatório de
uma traumaticamente asfixiante modernidade, em cujo estuário, para usar a
expressão adotada por Marshall Berman em seu fecundo ensaísmo, “tudo o que é sólido desmancha no ar”, nada ficando de pé diante da
voragem impiedosa do progresso, seja o “ciclo do algodão, ciclo do barão, ciclo da jaca, ciclo da mulata,
ciclo dos coronéis, ciclo dos cartéis, ciclo do boi, ciclo do já foi”.
Aqui, nas
asas da vigorosa denúncia social que esses versos encerram, a lacerada
e impotentemente cultivada
memória do passado
é esmagada pelo
fraturado e intranscendente tempo
presente, tornando-se incertos
todos os horizontes de expectativas de um futuro, mais que desconhecido,
ameaçador, já que, cindida ao meio, a cidade, dolorosamente cantada
pelo poeta, é uma clivada
partitura, cujas notas musicais mais significativas jamais se
harmonizarão.
Uma é a
nostalgia impotente do que se foi; a outra, a inalcançável utopia do que nunca
vai ser, a “ruína barbárie
/ de uma acareação em série / redundará às duas / uma procissão de cáries / uma
está entrevada até os ossos / a outra tem penhoradas as veias do pescoço / uma
quer exílio / a outra, auxílio / mas na embaixada do meu peito / meu coração em
beleza / põe mesa e lhes dá asilo”.
Exilados
ambos, o poeta e a sua cidade, natural extensão das suas vivências íntimas, só
lhes resta, ao desolado poeta e à arruinada cidade, o asilo da poesia,
coreografado pela força escarninha do seu debochado ritmo e aquecido pelo fogo
purificador da sua virulenta e cortante tessitura imagística.
Da Ópera
Barroca e o seu dramático jogo de contrastes,
seguimos para O Shopping de
Deus. Lá encontramos não somente a alma do negócio
como também a imagem mais irretocável do multifário e tumultuado espírito da
modernidade, dividido entre a hóstia e o cartão de crédito; entre a fé avulsa e
a razão convulsa; entre o céu e o inferno de cada eternidade feita sobre os
escombros fugazes de cada epifânico instante.
Discordo
da afirmação do ensaísta Marcelo Coelho quando ressalta que
na obra poética
de Luís Augusto
Cassas tenha havido
uma fase marcadamente religiosa, da qual o Retorno da Aura e Liturgia da Paixão pontificam como momentos
culminantes, a que se seguiria um mergulho mais vertical na materialidade do
mundo, acerca do qual esse inquietante O Shopping de Deus se corporificaria como a onda mais efetiva.
Não. O
conceito de fase, pelo que implica de estanque e estacionário, me parece
absolutamente incompatível com a poliédrica cartografia de um imaginário poético
deslizante que parece
estar, desde o primeiro
verso produzido, celebrando
ou querendo celebrar,
contra todas as interdições inerentes à nossa congênita falibilidade,
uma, reiteremos, epistemologia abarcadora de todas as dimensões da realidade, “matrimônio e litania dos opostos”, somente para usar duas belas
imagens mobilizadas pelo poeta maranhense.
Pluridimensional
e portadora, isto sim, de
múltiplas faces que coexistem
simultaneamente na tessitura
plural de uma
vasta e complexa identidade poética que, no limite,
chega a lembrar o heteronímico projeto estético idealizado por Fernando Pessoa,
Luís Augusto Cassas, tanto quanto o genial poeta português, parece querer “deixar ao cego e ao surdo a alma com
fronteiras, para sentir tudo de todas as maneiras”.
Por essa
razão, também discordo frontalmente das leituras setorizadas que insistem em
reduzir O Shopping
de Deus, inventado
pelo mercador das palavras,
Luís Augusto Cassas,
ao unidimensionalismo redutor da
mera denúncia social das narcotizantes engrenagens do consumismo, do qual o shopping, imantado por sedutora aura,
funcionaria como clausura predileta, templo primordial e porta-voz oficial da
sua irresistível propaganda.
Aliás, contra
o equivocado lugar-comum em que normalmente claudica a crítica das obsessivas
sondagens do conteúdo, desatenta aos negaceios e malandragens da forma e dos
subterrâneos simbólicos do texto, ainda que tal separação obedeça apenas às
travessias do recorte didático, o próprio eu-lírico multifacetado do abrangente
sistema poético engendrado por Luís Augusto Cassas afirma, em acendrada postura
metalinguística, “Se
alguém disser / que é a favor do espírito / mas contra a matéria / não me
compreendeu: / quem não está comigo / não está nem consigo”.
A
angústia na poesia de Luís Augusto Cassas, nem sei bem se esse é o termo
adequado, nada tem do desolado niilismo imanente a significativas parcelas
da lírica presentificada nos
decantados tempos pós-modernos, nem muito menos se organiza em torno do surrado
mote segundo o qual a nossa era prioriza a matéria em detrimento do espírito.
Nada
disso. O desconforto estético-ético-religioso-metafísico-lógico- ontológico,
que recobre todas as camadas afetivas da expressão poética do notável poeta
maranhense e lhe empresta um tom e dicção originalíssimos em nossa
plurifacetada lírica contemporânea, em cujo estuário não falta nunca a
celebradíssima esperança, provém
exatamente do fato de que a poesia e o homem, a arte e a ciência ainda
não foram capazes de perceber que são faces indissociáveis de um mesmo projeto
divino-humano que clama por total plenificação.
Prosseguindo
nesse itinerário desbordante das revoltas águas da poesia, desembarcamos no
híbrido e desconcertante santuário do Deus Mix, de cujo código bíblico,
recriado paródica e palimpsestuosamente, emerge
uma procissão de
preces que, caleidoscopicamente, uma
vez mais, consorcia o alto e o baixo, o solene e o trivial, a suma
transcendência e a
mais desauratizada percepção
da fenomenologia humana. Tudo urdido e curtido por um refinado
pathos humorístico e por uma extremamente risível alquimia verbal,
mas que nada tem, que fique bem claro, do raquítico ludismo trocadilhesco em
que se convertem certas escrituras
poéticas da contemporaneidade, indigentes
de imaginação, criatividade e,
mais que isso, de um mínimo de verticalidade no processo, nem sempre fácil, de
junção de fecundidade imagística e profundidade do pensamento.
No
divertido humor presente na poética de Luís Augusto Cassas não falta a
gravidade alegre da tonalidade de meditação existencial polimorficamente
lançada sobre todos os desvãos e abismos que existem e compõem a multifacetada
realidade humana.
Em O Vampiro da Praia Grande, revisitando e
atualizando o mito do ser trevoso, que faz do sangue das suas vítimas a
sua fonte basilar de sobrevivência, Luís
Augusto Cassas, fiel ao
seu caleidoscópico construto
poético, transforma o cotidiano da Ilha de São Luís na matéria-prima do seu
errante e debochado roteiro. Do texto da cidade à cidade vista como texto, a
lírica do poeta, poética e transgressoramente, vai fiando e desfiando todos os
tecidos de uma pólis prenhe de múltiplas significações.
Nesse
patamar, a cidade é o cenário privilegiado de quem, ocultado diplomaticamente em algum sobrado
colonial da Praia
Grande, espreita corpos e almas, corações e mentes, de preferência,
claro, uma descuidada e bem
nutrida jugular. Indiferente às celebrações orgiásticas de uma
modernidade triunfante, porque triunfalista, o vampiro inventado por Luís
Augusto Cassas, cômico-lírico-apocalíptico e sensual, posa para colunas
sociais, toca sax para sex
shops,
estaciona nos semáforos, monta barraca na Praia Grande, numa atlética e
trepidante peripécia pela sedutora pólis.
Instituindo
o recorte parodístico, que desconstrói as culturas oficializadas e dessacraliza
os vetores que lhe dão suporte, O Vampiro da Praia Grande é uma dentada certeira no convencionalismo e conformismo
das literaturas puramente livrescas, destituídas do sangue vital de palavras
que, quando bem combinadas, transfiguram e reinventam a vida. Quem duvidar, que
exponha o seu pescoço ao vampiro da Praia Grande, e… boa leitura.
Em
Nome do Filho
sinaliza para mais uma aparição poética do originalíssimo construto textual do
maranhense Luís Augusto Cassas, para quem a arte não pode ser diletantismo, nem
a literatura mera pirotecnia verbal, cultura da inautenticidade para um mundo
visceralmente enfermo.
Em
Nome do Filho,
décimo segundo livro de uma família poético-espiritual desconcertantemente
diversificada, ancora num projeto mais amplo de há muito perseguido pelo poeta:
a reconciliação de todos os opostos, a superação de todos os atritos, a
comunhão de todas as almas, a irmanação de todos os espíritos;
a cura, enfim, do bicho homem, e
a promoção da fraternidade universal, utopia ainda irrealizada e, pior que
isso, distante.
Aqui,
nesse viés, marcado por inocultável ânsia de participação comunitária, a
poética de Luís Augusto Cassas se matiza de indisfarçável feição social. Mas de
um social que, pejado de vigorosa ancestralidade romântica, nasce antes no
coração que na mente, fruto agônico da unidade que a tudo preside; e que o
poeta, obsessivamente, persegue.
Em
Nome do Filho,
transido entre a força dos interditos e a fúria das transgressões, parece ratificar
a crença de que o homem é, acima de tudo, possibilidade de superação e
capacidade de transcendência. Essa tensão entre o ser e o devir, entre o já e o
ainda não, cristaliza-se a partir da própria capa do livro, em cuja tessitura
iconográfica 1 agramos um nítido jogo de intencionalidades poéticas. À
imponência arcaica do templo se contrapõe à perplexidade de um olhar carente de
um horizonte de expectativas mais promissoras.
O livro
nasce sob a égide da profecia que o anjo das ruínas faz, em tonalidade
densamente solene, recair sobre a cidade de São Luís, que preserva a
arquitetura de monumentos históricos e, de acordo com a cosmovisão do autor,
condena às trevas da fome e desassistência completa a infância, essa espécie de
passado rasurado, presente incerto e futuro eternamente adiado.
Mas,
advirta-se logo, o novo paideuma poético trabalhado e retrabalhado por Luís
Augusto Cassas, com a pressa do jornalista, a paciência do filósofo e o
inarredável fervor dos místicos, nada tem de inflexibilidade doutrinária ou
sectarização ideológica; antes, nutre-se da mais acendrada liberdade, sempre
pródiga em descartar-se do já atingido e voar à procura de novas e incertas
utopias. Eis o seu credo, evangelho, testamento e saga; saga de um pássaro feito
do azul do infinito e da
chama ardente da poesia.
“Ser da
distância, do ainda-não e do futuro”, consoante a lúcida percepção
de Marco Lucchesi, Luís Augusto Cassas ratifica a profissão de fé na literatura
e, desse modo, nos convida a dizer: “Bendito o que vem em nome da poesia”.
Chegamos,
pois, ao território mítico-sacral do Evangelho dos Peixes para a Ceia de Aquário. Mesmo numa leitura
despretensiosa e desprovida de maior verticalidade hermenêutica, constatamos
que este livro ancora-se, diria mesmo obsessivamente, no recorrente motivo da
água, com todas as implicações decorrentes do seu ostensivamente fecundo
simbolismo. Simbolismo que, em meio a outras inúmeras possibilidades
conceituais, se nucleariza, fundamentalmente, em torno de três temários
básicos: a água como fonte originária de toda vida; instrumento primacial de
ascese e purificação do ser; e, por fim, centro regenerador de tudo.
Na
poética postulada por Luís Augusto Cassas, a água, tematizada e, mais que isso,
transformada em valor primevo da existência, vai, à luz das transfigurações
estéticas que lhe impõe o poeta, transitando por todos esses domínios,
mesclando-se a outros que o imaginário do poeta urde e convoca para a
reinvenção lírica da sua multiforme experiência humana e estética.
Dessas três
instâncias por onde a água
agencia o seu
itinerário de viscerais transformações, fixamo-nos naquela que, em nosso
modo de entender, emblematiza, mais efetivamente, a libertária mundividência do
poeta maranhense: a que propõe a ascese e a purificação do ser humano no palco
rasurado da sua sempre problemática peripécia histórica.
A poética
de Luís Augusto Cassas, desde a sua arqueologia originária até as súmulas filosóficas
presentes em suas profissões de fé mais recentes, sempre perseguiu,
holisticamente, uma utópica unidade da condição humana, bem para além das
duvidosas e contraproducentes fragmentações, sempre reducionistas e, pior que
isso, incapazes de pensar e apreender o homem em sua fascinante e profunda complexidade.
As águas
que inundam o credo deste evangelho e dão o molho a esta profética ceia de um
amanhã em que o poeta acredita e que certamente há de brotar, apesar das
interdições de um hoje resistente, falam de Deus e da poesia, face e contraface
de uma percepção totalizadora dos fenômenos; do cósmico silêncio e dos gritos
que ecoam pelas praças e pelas consciências; do profano e do sagrado; do
corpóreo e do etéreo; da morte e da vida; da quietude e da celebração; enfim,
da vasta e tenebrosa unidade de tudo o que temos e somos.
Eis-nos nas
bordas de um
mistério insistentemente inquirido pelas revoltas águas da
transdialética poesia que o poeta constrói, consumando-se e consumindo-se.
Mesmo sem querermos revalidar a surrada tese de que a literatura é vida, e a
arte é documento mimético do real,
postulados em tudo conflitantes com a
autonomização do texto artístico defendida
por Lotman, não há negar
que a travessia
poética empreendida por Luís
Augusto Cassas parece
querer instaurar, nos (des)limites da palavra trabalhada, uma
espécie de intransigente compromisso ético com um projeto mais amplo de
transformação social; aquele que propiciaria ao homem um reencontro consigo
mesmo, com a natureza e com o outro, resgatando-se, desta forma, a
essencialidade de um genuíno diálogo, fora do qual o que existe é o precipício,
consoante a lúcida assertiva do mestre da crítica literária de base
ontológico-hermenêutica, Eduardo Portella.
Poderíamos
ainda enveredar pelo código amoroso, pelas sendas da compaixão, ou, quem sabe,
pelo apego telúrico que ratifica as indeslindáveis vinculações do poeta ao seu
povo e à sua terra: o homem e as suas inescapáveis circunstâncias, no eterno
dizer de Ortega Y Gasset. Basta-nos,
entretanto, constatarmos que,
no evangelho pregado
por Cassas, e na ceia por ele servida com a paixão da linguagem e o
molho das palavras, como diria Adélia Prado: “A poesia, a mais íntima, é serva da esperança”.
Eis-nos,
pois, no mítico território de O Filho Pródigo: Um Poema de Luz e Sombra, em cujo estuário,
dialetizando o voo da luz e o abismo das sombras, Luís Augusto Cassas, a partir
da fundante figura do seu pai, já falecido, realiza uma dolorida e
verdadeiramente poética arqueológica da sua alma, tecida e destecida nos porões
mais indevassáveis da saga familiar, lá onde, desde a nossa fecundação no útero
materno, passando pelas tessituras lúdicas da infância, até o desembocar no
crepúsculo da existência, a velhice, a flertar com a morte, todos os fios da
nossa existência se vão compondo definitivamente, para o bem e para o mal.
Livro
maduro, ancorado em tonalidade ostensivamente solene, ora celebratória,
ora elegíaca, O Filho Pródigo, precedido por
vasta rede de bem construídos diálogos intertextuais, promove, com
visceral e angustiante sinceridade, uma espécie de acerto de contas que Cassas
faz consigo mesmo, com sua origem, história e destino; nuclearizada, toda essa
densa épica do ser, pela dominante figura do seu pai, erguida, agora, à
condição arquetípica de um símbolo existencial a acompanhar o poeta pela vida
afora, com a luz e a sombra de que é feita a sórdida e sublime matéria de todos
nós.
A
paradigmática imagem do pai, transfigurada de forma multidirecional na lírica
brasileira contemporânea, reencontra
na originalíssima dicção de Luís
Augusto Cassas um singular e pungente tratamento. Antes dele, outras vozes do
imaginário poético nacional, a exemplo de José Paulo Paes, Ledo Ivo, Carlos
Drummond de Andrade, realizaram escavações existenciais portadoras de raro viés
verticalizador.
Luís
Augusto Cassas, assim, prolonga, radicalizando, esse verdadeiro leitmotiv de nossas cogitações líricas
mais recorrentes. E o faz com rara competência, sabendo, como poucos, consorciar
destreza no musicalíssimo manusear das palavras, a elas servindo e não delas se
servindo, como teoriza Jean-Paul Sartre, a uma mundividência rica de místicas e
catárticas ressonâncias. Como se da tragédia da vida obnubilada pela morte
emergisse, com as imorredouras tintas da esperança, a utopia da transcendência,
a crença na vida que ultrapassa a laje fria da sepultura, a certeza do cósmico
e ansiado retorno à Casa
do Pai.
Recorrendo
à originária saga bíblica, damo-nos conta de que é bifronte o itinerário de
sombra e luz traçado pelo Filho
Pródigo. Ele, inicialmente,
se autoexila do casulo paterno para, depois de traumática peregrinação espiritual
e dramático desfrute da liberdade, retornar, reconciliado, à pátria das suas
origens. Aqui, o distanciamento do sujeito funciona como senha que lhe propicia
uma compreensão mais holística, tanto de si mesmo quanto da realidade que o
cerca.
Parece
rumar na mesma direção o movimento empreendido por Luís Augusto Cassas na
cartografia poética por ele engendrada. Com Otto Maria Carpeaux, aprendemos que
“a distância falsifica
inteiramente a perspectiva”. O poema de Luís Augusto Cassas vinca esse distanciamento,
subjacente ao qual residem as possibilidades hermenêuticas mais efetivas de
compreensão do seu passado, presente e futuro, como se, mirando-se no espelho
da sua progênie, pudesse o poeta, junguianamente,
desvendar as faces e contrafaces do inconsciente coletivo mais profundo.
Organizando-se, tridimensionalmente, em
torno de vigorosos núcleos ideativos,
fascinantes incursionamentos
pela seara das imagens e acendrados mergulhos nos oceanos da
musicalidade, para nos reportarmos às reflexões empreendidas por Ezra Pound em
seu ABC da
Literatura, O Filho Pródigo, promovendo o reencontro de Ulisses e Telêmaco, de acordo com a acertada assertiva de Marco Lucchesi,
se impõe como um dos pontos mais altos da poética de Luís Augusto Cassas.
Embora seja
o oitavo livro
de poemas de
Luís Augusto Cassas, deixamos para discorrer sobre Titanic-Boulogne — A Canção de Ana
e Antônio — na
parte final do nosso ensaio, em virtude do fato de estar ele centrado na
temática amorosa, a mesma que nucleariza A Mulher que Matou Ana
Paula Usher, penúltimo
livro da saga
poética que, competentemente,
Cassas vem construindo ao longo de quase três ininterruptas décadas de criação
literária.
Titanic-Boulogne
— A Canção de Ana e Antônio
é um delicioso livro, no qual, pretextando recontar a desencantada história
amorosa vivida pelo poeta Gonçalves Dias e Ana Amélia Vale, história essa
interditada por preconceitos de motivação racial, Luís Augusto Cassas, na
verdade, promove uma espécie de “biografia afetiva de todos os amores inconclusos”.
Alargando
o compasso do drama amoroso vivenciado por Gonçalves Dias, e esculpido em
alguns dos seus mais comoventes poemas, Cassas é como se ocultasse nas malhas
da diegese lírico-dramática que inventou
e, ato contínuo,
cede espaços para
que outras vozes,
igualmente às voltas com os fascínios e abismos do amor, se ergam em sua
poemática eivada de inescondível recorte intertextual.
Com
Julia Kristeva aprendemos
que “o
texto literário é um
mosaico de citações”,
por onde múltiplos textos se cruzam e recruzam numa espiral
semiótica in+ nita. Titanic-Boulogne —
A Canção de Ana e Antônio promove este intercâmbio
textual de forma explícita, numa
dialogicidade fecunda que ilumina e se
ilumina com o onipresente temário amoroso.
O
poema já
se inicia sob
a égide da
retomada de um verso
de Castro Alves, mais precisamente o
que abre o
grandioso Navio
Negreiro — Tragédia no Mar.
No cartão de embarque da longa viagem empreendida pelos poetas Gonçalves Dias,
Cassas, e por todos os que são tocados
pelo trágico milagre do amor, “estamos
em pleno mar”. No mar
das paixões, no mar das palavras, no mar da história, no mar das idealizações
sonhadas, no mar dos sonhos vividos, no mar dos desejos negados, no mar dos
prazeres proibidos, no mar da poesia. Poesia essa que tem o dom de eternizar o
instante e, ao fazê-lo, garantir um fiapo de esperança, aquilo que Goethe
chamava de “promessa de
felicidade”.
Talvez
seja essa a razão que levou o poeta maranhense a colocar um tom de esperança em
meio ao caos gerado pelos naufrágios amorosos. É assim que leio a estrofe final
do poema com que se inicia a bela travessia marítimo-amorosa empreendida por
Luís Augusto Cassas:
“Mas
não esqueçam a água
do inconsciente coletivo:
viver não é morrer de mágoa.
Favor: não afoguem o livro”.
Assim
fazendo, Cassas transcende o que poderia à primeira vista parecer uma poética
elegíaca e flagra no amor, pesar dos seus desconcertos, a única fonte capaz de
conferir ao homem a tão sonhada plenitude existencial. Outros intertextos comparecem ao livro. De um verso de uma canção da Bossa Nova a
poemas de Carlos Drummond de Andrade. Do perdido paraíso de Milton a alusões a
Dante. E tudo, vale salientar, temperado com os finos ingredientes de um humor
que ancora o livro no território da mais acendrada modernidade.
Titanic-Boulogne conta não apenas a
desafortunada história de amor de Gonçalves Dias e Ana Amélia. Dir-se-ia que
ele narra a história do próprio amor, esse mistério da alma que paralisa e
impulsiona, que “alenta
e consome / que é vida e que a vida destrói”, no dizer romântico de Almeida Garrett. Narrativa poética
atemporal, a de Cassas faz passado e presente contracenarem nas asas da beleza
da poesia e da força do amor.
Em A Mulher que Matou Ana Paula Usher, depois
dos arrazoados de
Paulo Urban, Amnéris
Ângela Maroni e
Marco Lucchesi, verticalíssimos
todos, só me resta dizer que, aqui, nessa saga narrativa mítico-agônica, o
poeta maranhense revive,
nos abismos da
odisseia amorosa, o mistério da aventura humana, com as suas luzes e
sombras, paixão e vertigem. E o faz de forma desassombrada, sem temer os
avessos da empreitada, descendo ao chão da mais humílima dor, a fim de subir ao
céu do mais transcendente deleite.
Nesse
poema-romance, vida/morte dialetizam-se, face e contra-face da ancestral
peripécia humana nos
degradados palcos da
história. Já Roman Jakobson, no alvorecer do século vinte recém-transato,
quando a crítica formalista travava suas primeiras lutas contra as leituras
extratextualistas então vigentes, afirmou que a literatura não vale pelo que
diz, mas sim pela forma como o diz.
Cassas
parece reatualizar, admiravelmente, esse clássico postulado jakobsiano, ao enfrentar, matizando
com novas e alquímicas colorações, o velhíssimo e sempre jovial temário
amoroso. O amor, sabe-se bem, tem se constituído em verdadeiro leitmotiv das cogitações literárias de
poetas, ficcionistas,
dramaturgos, de tantos
quantos fazem da palavra o seu privilegiado instrumento de
transfiguração do cotidiano.
Na
poética empreendida por Cassas, em A Mulher que MatouAna Paula Usher, o
amor é encarado
em perspectiva totalizadora
e matizado pela presença
de todos os
contrários possíveis. Amor que a tormenta e pacifica, enclausura e
liberta; sinal de carência e indício de plenitude. Amor que transcende o fogo
primevo da carnadura erótica ou mesmo o milagre do afeto que circunda as
abismais regiões da alma, para atingir um plano espiritual mais alto e
indevassável. É o instante em que, em acendrada postura confessional, o eu
lírico confessa: “Tenho
a nostalgia do todo / e a melancolia da parte”.
Eis,
aqui, o etymon da perquiridora poesia de Luís
Augusto Cassas. A direção da sua
obsessiva busca. O indisfarçável sentido
da sua transdialética utopia. Noite escura da alma, lâmpada acesa do espírito,
o amor, cantado por Cassas, é exorcismo de fantasmas e voo em direção ao infinito
desejo de plenitude, que conduzimos
dentro de nós, pesar dos negrumes da existência e das
múltiplas formas de interdição sedimentadas
pelo rasurado tecido
da história. Para além da inevitável finitude que perpassa
todas as experiências amorosas, Cassas parece querer celebrar, também, a
delícia infinita do amor, seus momentos de realização e sua força de abertura
que ele enseja para uma compreensão totalizadora da trajetória humana.
Bacuri
Sushi — A Estética do Calor
dá sequência ao itinerário multiforme que a poesia de Luís Augusto Cassas vem
desenhando no mapa poliédrico da lírica brasileira da contemporaneidade.
Barroquista e solar, apaixonado e irônico, transgressor e solene, aqui, Cassas,
mais uma vez, percorre, tal qual requintado flanêur,
todas as geografias da Ilha de São Luís, delas recolhendo cheiros, tons,
gestos, palavras e silêncios, ingredientes com os quais, com o molho da
linguagem e o tempero da poesia, assina, definitivamente, o seu nome no
desbordante território da poesia brasileira.
Hino de
amor à poesia e ao povo do Maranhão, Bacuri Sushi — A Estética do Calor reinsere o poeta na tessitura
íntima da cidade, seus becos, praças, feiras, mercados, templos, gritos, silêncios,
sua alma profunda, seu espírito mítico e indevassável. Credo, evangelho, profissão
de fé,
Bacuri Sushi
— A Estética do Calor é um poema-cidade, é a
cidade vista como poema. E, nela, eis a alma do poeta consumindo-se,
ensolarada.
Poemas
para Iluminar o Trópico de Câncer, produção mais recente do poeta Luís Augusto Cassas, não
deve ter sido um livro fácil de ser redigido. Como, de igual modo, não é um
livro fácil de ser lido. Como toda obra
de arte digna
dessa categorização, guarda,
em suas entranhas, o mágico sopro
da vida; e aquilo que, com invulgar lucidez, Camões, em sua pluridimensional
lírica, chamou de um conhecimento que nasce no solo concreto das vivências
reais.
Repelidas
a mera engenhosidade laboratorial e as literaturas descarnadas e livrescas,
sobre as quais tão bem se pronunciou o Lima Barreto de O Destino da Literatura, o que avulta, nesse pungente
livro, é uma autenticidade confessional raras vezes vista no campo da expressão
literária.
Desnudado
diante dos imponderáveis da vida, dos quais ninguém se pode eximir, o poeta
transfigura, sem pieguismo ou sentimentalidade menor, um drama existencial que
se abateu sobre ele; e o transforma em matéria poética dotada de profunda
beleza estética e vasto interesse humano.
Flagro,
de pronto, no estuário desses Poemas para Iluminar o Trópico de Câncer, dentre outras, duas dicções,
que me parecem nucleares para a configuração da mundividência ostentada pelo
livro. A primeira delas marca-se, a meu ver, por uma ostensiva tonalidade de
resistência ao infortúnio e, ato contínuo, por uma recusa a demitir-se da vida,
capitulando diante das tragédias que elas abrigam em sua estranha essência.
Sabendo, decerto,
que “grande diferença faz/ entre lutar com as mãos/ e
abandoná-las pra trás”,
fala do mestre carpina ao Severino retirante,
no belo e
comovente Morte e Vida Severina — Auto de
Natal Pernambucano,
de João Cabral de Melo Neto, Cassas, nesse corajoso e denso livro, entoa, por
um lado, um canto de resistência aos descaminhos da existência, e, por outro,
assina um digno protocolo de intenções com a esperança.
Ratificando
os vetores da solaridade poetica que lhe imanta toda a obra, Cassas instaura
sua travessia sob a égide bifronte dos signos da luz (eternidade) e do sopro
(efemeridade), isotopias semióticas que regem a oferenda com a qual,
liturgicamente, ele oferta, oferecendo, uma vida o tempo todo transfigurada
pelo fogo poético.
É aqui,
neste instante paroxístico da existência em que o tempo e a eternidade parecem
compor um indistinguível jogo especular, que a poesia de Cassas, sempre tão
densamente matizada pelo voluptuoso halo da transcendência, em tudo flagrada,
mais se refina e espiritualiza, como podemos constatar, exemplarmente, nas
epígrafes de que ele se vale em seus funcionalíssimos diálogos intertextuais.
Se o
texto literário, retomando o lúcido dizer de Julia Kristeva, “é um mosaico de citações, um modo
como o texto lê a historia e é por ela atravessado”, a poética de Cassas,
presente em seus Poemas
para Iluminar o Trópico de Câncer, ratifica esse dialogismo semiótico, ancorando no
privilegiado porto dos incursionamentos transcendentes.
É quando
o poeta, guiado solenemente por aqueles a quem classifica como
Mestres do Jardim,
é conduzido “à prece e
meditação/ abrindo-me os pesados trincos/ dos jardins da compaixão”. A compaixão, tão
recorrentemente perseguida pelo poeta, não é conquista fácil do espírito, mas
sim o ponto final de uma travessia do ser, que tem na porta estreita do
evangelho cristológico a sua meta de chegada e o seu alvo de partida para mais
novos e arrebatadores voos da alma em direção ao infinito de todas as suas
possibilidades.
Rumi,
Hegel, Davi são outros personagens que
Cassas convoca em seu espólio poético,
e com os quais ele interage em sua fascinante e dramática viagem, cujo espaço
percorrido é menos o das geografias físicas do que o seu próprio universo
interior, céu e abismo do seu ir e vir ao coração misterioso da existência.
Nesse
itinerário, o poeta se depara como “o abismo no corpo/ o vento no rosto/ o inverno nos ossos/ ao
fundo do poço/ do grande vazio/ onde rompem-se os véus/ o fundo do nada/ nos
braços de Deus”.
É, enfim,
nos braços de Deus que o poeta anela atravessar o que os místicos chamam de “a
noite escura da alma”. Livro forte,
denso, confessional, autobiográfico e,
ao mesmo tempo,
universal pelo que ostenta de comovente humanidade, os Poemas para Iluminar o Trópico de
Câncer descem,
fundo, ao cerne essencial
da bifronte condição humana:
vocacionada para a eternidade e, diria Ledo Ivo, “sujeita à injúria de tornar-se pó”.
Desse livro,
eivado de impressionante sinceridade,
sai o poeta “com olhos de epifania”, certo de
que “só se realiza o ser/ quando o amor vence
o poder/ em todas as hierarquias”. Reitere-se, pois, à guisa de conclusão,
que, aqui, Cassas
não ergue um muro de lamentações, nem muito menos compõe, com a música
da melancolia, um cantochão
elegiaco diante do que se lhe a figura, e a todos nós, o inesperado, o surpreendente,
o antialumbramento.
Não. O
poeta, como o Nicodemos que espreita o Cristo nas sombras agudas de uma vívida
noite palestina, admite que pode nascer de novo, com a semente da fé, a água da
purificação, o tesouro da ciência e a vulcânica força da poesia. No limite, a
arte poética é encarada como fonte suprema
de consolação; morada
definitiva de todas
as utopias possíveis; habitação
do ser; e, por fim, inviolável reduto do último ideal a ser perseguido pelo
homem no interior de uma civilização irresistivelmente matizada pelo sentimento
da crise.
Em
síntese, dir-se-ia que este livro de Cassas, imantado pela ostensiva presença
da função catártica da literatura, revive, reafirmando, os esperançosos vetores
de quem, conforme o emblemático título de um livro do poeta Tiago de Melo, sabe
que “faz escuro,
mas eu canto, porque a manhã vai chegar”. Cassas, como nos famosos versos de Cecília Meireles,
canta “porque o
momento existe/ e minha vida está completa/ não sou alegre nem sou triste/ sou
poeta”.
Poeta
que, em Tao à
Milanesa,
antenado com a melhor cosmovisão da pós-modernidade, mescla várias dicções,
ratificando, desse modo,
assumidos processos de hibridização estilística. Ancorada, hegemonicamente, no
motivo do caminho, enquanto vetor semântico densamente significativo na configuração
da diegese lírica, Tao
à Milanesa reúne, na
diversificada coleção de poemas que exibe, as mais diferentes temáticas, como
se o eu-lírico que percorre o mundo em sua desconcertante totalidade, portasse
uma câmera capaz de flagrar todas as cenas de um cotidiano prenhe de
transcendência e cercado de epifanias por todos os lados.
A viagem,
a meditação, a música, a palavra, o silêncio, a plenitude, o vazio, a experiência,
a regressão ontogenética
do eu até
as regiões assêmicas da completa
inconsciência, a leitura,
a ecologia, a
beleza, a ciência, a fé, a
história, o cotidiano, o amor, e temários outros que se vão agenciando num
texto marcado por acendrada ludicidade, tudo vai compondo a imagem de quem
se confessa portador de “uma sede de viver que sangra/ e o trespassa com ígnea espada”.
Há
também, nesse Tao
à Milanesa,
gastronomia poética servida, amorosamente, pelo poeta maranhense, a vertente
metalinguística, que aciona, na esteira
das postulações de
Paul Valéry, a
alta consciência artesanal de que
se reveste o seu ato/processo de criação literária.
Mas, de
pronto, advirta-se que a metapoesia a que aludimos nada tem a ver
com o ramerrão
repetitivo, não raro
indigente, de certas aventuras literárias
da contemporaneidade. Pensamos, aqui, o auto-centramento da linguagem, naqueles
sentido mais cultural e ideológico proposto por Alfredo Bosi em seu clássico
livro O Ser e o
Tempo da Poesia.
Metalinguagem como canto de resistência do poético, tornado autista e condenado
à solidão e à incomunicabilidade em nossos desventurados tempos.
Assim sendo,
“a branca folha quieta/ é
meu oráculo predileto”, confere o poeta, convicto de que “deus fala através das penas/ as
penas através dos temas/ os temas através dos poemas”. E, de igual modo, de que “a poesia / a poesia é a melhor
psicoterapia”. Poesia
que, conquanto seja, bandeirianamente, alumbramento, oferenda gratuita e achado
súbito e quase inconsciente, é, também, luta com as palavras, negaceio, recusa,
silêncio indomável e traumática indizibilidade.
No
cardápio estético de Cassas, de que Tao à Milanesa é prato saboroso, a
alegria é ração
diária contra o
tédio, pílula de sanidade e privilegiado antídoto contra as
dores do mundo. Com afiado humor, não raro descambando para a tonalidade da
sátira, Cassas investe também na crítica social; e no sinal de menos que põe em
certos cacoetes intelectuais que não cessam de rondar as paisagens mais
charmosas, e certas também, de nossa contemporaneidade.
O culto filosófico
ao niilismo, por exemplo, é mostrado por Cassas como um lugar-comum, que,
embora sempre alardeado com a força imperiosa das seduções sensacionalistas, já
não comove ninguém. Discorrendo
sobre o filósofo
dinamarquês Soeren Kierkegaard,
France Sarago afirma que em sua obra “a reflexão intelectual é indissociável de uma atitude espiritual
que se inscreve, ela mesma, em uma história privada, não
comparável a nenhuma outra, como
acontece com todas as existências
humanas. Esta vida alimenta sua obra, e isto não nos permite fazer cortes em
sua imensa mola, para dela isolar o aspecto propriamente filosófico negligenciando o
resto. Seria não
somente uma infidelidade imperdoável à pessoa que fala
através da obra, a pessoa que se descobre no Diário Íntimo, tesouro inesgotável
de reflexões e meditações, de facetas do espírito e orações, onde a sátira e o
anedótico vivem lado a lado com a elevação mística ou a meditação filosófica”.
Tal aguda
assertiva, cremos, pode ser aplicada ao universo poético de Luís Augusto
Cassas, guardadas, evidentemente, as distinções existentes entre
os gêneros discursivos em tela: a filosofia
e a poesia. Contudo, o cerne conceitual é o
mesmo. Na poesia de Cassas, não há espaço para formas meramente
intelectualizadas; para um retoricismo muitas vezes vazio e carente do sabor da
vida.
Não
queremos, com isso, revalidar a vetusta tese de que literatura é espelho
translúcido da vida. Ainda entendemos serem válidas as considerações levadas a
cabo pelos formalistas russos no início do século recém-transato. Mas
não nos agradam
os meros jogos
de linguagem sem nenhuma conexão
com o rio vital da existência e da realidade efetiva dos homens no palco
concreto e impuro da história. Em Cassas, vida e obra dialetizam-se. Tao à Milanesa é mais um testemunho desse
inseparável conúbio entre o humano e o estético.
Ezra
Pound conceituou o fenômeno poético como
o consórcio dialético entre a
música, a imagem e a ideia, as quais, emulando no território concreto das
palavras em estado de transfiguração,
reinventam o mundo, com especialidade aquele que o poeta carrega dentro de si, desde as suas mais míticas origens.
Origens que, de pronto, remetem ao sagrado casulo da família, em cujo cenário a
figura da mãe emerge como protagonista maior, energia primal que se irradia
sobre tudo e
todos, caudalosa e incontornável fonte de
todos os afetos, ceia sagrada e pão transcendental que nos alimenta e
constitui cada tecido do nosso ser.
Eis o
fulcro temático indisfarçável da bela e comovente oferenda lírica que Luís
Augusto Cassas constrói para, com ela, imortalizar, com a incendiada e
passional força do seu verbo, a imagem da sua mãe, “o sol estrelado/ nas bandejas de
café/ sobre as manhãs de linho branco/do ofertório do mundo”. Examinado detidamente, o
poema de Luís Augusto Cassas se ergue, inicialmente, como um hino celebrado por
uma memória que quer salvar das lajes frias do esquecimento um tempo mais
fraterno, no qual os
almoços do domingo em família
se convertiam em raros banquetes de comunhão entre os que,
assentados em torno de uma mesa, mais que a gastronomia farta, fartavam-se de
alegria e de um amor visceralmente compartilhado, signo e motivo recorrente em
todo o livro, única película de sanidade encontrada pelo poeta para um mundo em
franco processo de estilhaçamento de todos os seus valores.
Ceia
farta e sem nenhuma restrição aos muitos que dela se acercavam, Míriam, a
mãe-mítica-matriarca-múltipla em seu incansável ser/ realizar no seio familiar,
não hesitava em fazer “das tripas
coração” para
saciar os anelos dos que, saciados do pão material abundante, lhe reclamavam “ágape”. Ágape esse que se converte na senha primeva e seminal da
configuração metafísica do sentido
da vida e
do ser, sem o qual a
existência debilita-se e queda-se, impotente, nas assemias do nada.
Mesclando
múltiplas dicções, do coloquialismo mais acendrado à solenidade tonal dotada de
fecundo simbolismo, o poema de Cassas é uma espécie de banquete afetivo
celebrado com rara pungência, própria de quem, ancorado nos signos e códigos da
alimentação, intertexto e discurso estranho da ficção, anseia, com desespero e
esperança, estabelecer as pontes
existenciais de reencontro com o paraíso perdido da infância, memória
mítico-ancestral de todas as vivências do ser.
Aqui, do
mesmo modo como já o fizera com o tocante O Filho Pródigo: um Poema de Luz e Sombra, Cassas nos dá uma arte
poética emergida das nervuras essenciais do seu viver intenso, do seu “saber de
experiências feito”, conforme a lapidar sentença do imortal verso camoniano, em
tudo avesso à literatura livresca, muitas vezes tão engenhosa e laboratorial
quanto desprovida do indispensável
sabor de vida, que todos buscamos
na coreografia das
palavras estabelecidas no
polissêmico e simbólico território textual.
Se “a poesia é o coração desfeito em
tiras”, de
acordo com o comovente dizer do
grande poeta português
Antonio Nobre, em A Ceia Sagrada de Míriam —
Oferenda Lírica, Cassas
revela-nos, sem disfarces, o coração impregnado de um
desmedido afeto por aquela que antevê como a “presença do eterno feminino em nós”. Música de reencontro, imagem de amor pluralmente revelado
e confessional conceito de utopia mais perseguida, a da mãe com os seus
incontornáveis mistérios, a oferenda lírica construída por Cassas, e
protagonizada pela Ceia Sagrada de Míriam,
é nostalgia profunda
do espírito, presentificação perene do passado e memória
definitiva daquilo que todos nós gostaríamos que fosse eterno: a mãe, sobretudo
porque, com Carlos Drummond de Andrade aprendemos que “Mãe não tem limite/é tempo sem hora/luz
que não apaga/quando sopra
o vento/e chuva
desaba/veludo escondido/na pele enrugada/água pura ar puro/puro
pensamento”.
Comedor
de adversidades e cultivador
incansável do signo
da esperança, Cassas, conforme
já dito,
é o poeta da luz
e da sombra; e, certamente, foi
dessa clivagem dolorosa que ele se nutriu para compor a Oferenda Lírica
dedicada a sua mãe, subitamente visitada pelo mal de Alzheimer, que, como o
próprio poeta sinalizou,
a fez submergir
“no escuro
silêncio do implícito e do inconcluso”.
Mas,
na contramão dessa
história matizada pelo
sentimento do susto, da surpresa e do sofrimento, A Ceia Sagrada de Míriam se impõe pela luminosidade,
pela força da palavra e pela dimensão afetiva de uma confissão amorosa com
a qual
o poeta intentou,
e conseguiu imortalizar a emérita figura de sua mãe, protagonista
principal da sua Lírica Oferenda.
Sem
romantismos ingênuos, mas sabendo captar, sem acidez, e com acendrado
realismo, os aspectos
mais dramáticos da
existência, Cassas, com invulgar lucidez, indaga: “Que é a vida senão morder/ os lábios
o amor as frutas/ conjugar ser e haver/ até verter a cicuta?” Flagro no realismo de Cassas
a ausência da acidez niilista diante da dor, porque do acre veneno de que a
vida está impregnada em todas suas
instâncias, ele soube
extrair, prodigamente, o mel da
poesia, o sonho da arte e a
utopia da literatura, sem os quais a existência não passaria de uma vil
caricatura e uma grotesca negação de si mesma.
Da Ceia Sagrada de Míriam rumamos, na travessia final
dessa hermenêutica que, ambiciosamente, pretendeu acercar-se de todo o espólio
poético do notável poeta maranhense, para sua obra final O Livro (composto de duas unidade
líricas: O Sentido
(Relatos da Fumaça do Incenso) e O
Paraíso Reencontrado,
espécie de testamento derradeiro de quem, tendo passado a vida inteira num
ininterrupto e apaixonado corpo a corpo com a poesia, logra o fechamento de um
ciclo pleno em si mesmo, marcado, em todo o seu ir e vir, pelo assumidamente
escorregadio signo da dialética.
Poeta
da luz
e da sombra,
do charco e
da estrela, da
ilha e do cosmo, do grito e do sussurro, da
transgressão e da contrição, da transcendência e da imanência, Cassas, ao longo
de todo o seu ato/processo de criação literária, perseguiu, sempre, a
construção de um projeto estético de natureza epistemologicamente holística,
capaz de demolir barreiras e erigir pontes entre os mais variados campos do
conhecimento, no encalço obstinado de perceber o sentido de tudo, daquilo que
livra a história dos homens de
ser a acabada metáfora do mais
ontológico vazio, e a existência de cada personagem que a habita, de se
converter em um mero lance de dados, completamente despido de teleologia.
Cassas
reafirma, no seu livro final, a verdade, a sua verdade mais íntima e
inarrancável, segundo a qual, o sentido último de tudo radica no reencontro do
homem com a sua visceral materialidade, com o seu indesviável terrenalismo, com
a sua profunda e intransferível vocação para a humanidade, na qual oculta-se e
revela-se a semente divina adormecida em suas entranhas.
Adormecida
e acordável para quem, voltando-se para a interioridade, logra abrir-se para a
alteridade, atingindo, desse modo, o tão anelado e adiado gesto de comunhão
universal. Nesse itinerário luminoso, há, diria Drummond pedras espalhadas pelo
caminho, e o espreitar da sombra que eclipsa a estrada parece eternizar a noite
e transportar para um distante e quase inatingível amanhã, a aurora de
plenitude pela qual anelam todos os homens.
Contudo,
a despeito das interdições históricas que pairam sobre a acidentada peripécia
humana, o poeta resiste; e o faz com a chama da poesia e o fogo do amor, senha
única para a reconquista do paraíso perdido, chave indisputável para o alcance
da verdadeira sabedoria, fora da qual o que existe é acúmulo egótico de
conhecimentos vazios que para nada mais servem, senão para ratificar o homem na
predatória e caricatural condição de lobo de si mesmo.
Em
acendrada postura confessional, o poeta maranhense sentencia: “entre silêncio e ruído/desço à
morada do fogo interior/onde arde/a chama do amor/no mistério de tudo”. Vê-se aqui, claramente, que
é o amor a semente sacral a arder nas profundezas do ser interior do poeta,
fazendo explodir, em seguida, o mistério de todas as coisas e, ao mesmo tempo,
a revelação definitiva da essência de tudo.
Noutro
momento, tocado pela mesma compreensão da realidade mais vertical do ser, o
poeta afirma: “por enquanto
da vida/só captamos os ruídos/mas o verdadeiro sentido/será definitivo/quando o
que clama/ desde Jerusalém/ irromper-nos à alma/com o seu amém”.
Em suma:
o motivo do amor, sobremaneira recorrente em O Livro (O Sentido: Relatos
da Fumaça do Incenso e O Paraíso Reencontrado), é o que confere à cosmovisão do poeta as dimensões mais
ostensivamente visíveis da sua seminal substancialidade. Basta ver o poema A Chegada da Luz, para se perceber, com
nitidez, o ontológico mergulho que o poeta dá no difícil e necessário temário
amoroso, equivalente, no âmago da sua criação, ao que ele julga ser a verdade
última e definitiva do ser.
Eis aqui,
diriam os críticos afeitos às leituras de cariz estilístico, o centro
espiritual dos aludidos livros de Luís Augusto Cassas. Fruto de uma longa e
visceralmente atávica convivência com a poesia, o inquieto e criativo poeta da
Ilha de São Luís e do cósmico continente de todas as geografias e universos
humanos, bem poderia gritar, tal qual um apocalíptico profeta do tempo novo
pelo qual todos anelamos: “A
poesia sou eu”, sem
que isso traduzisse qualquer ranço egocêntrico ou similar, mas apenas a confissão
de um relacionamento pelo qual toda a sua vida foi pautada.
A Poesia Reunida de Luís Augusto Cassas, em boa
hora colocada no mercado editorial brasileiro, para alegria dos que amam a boa
literatura, é um merecido reconhecimento a quem, diria Machado de Assis, tem
feito da arte da palavra a sua segunda alma. É, também, um gesto de consagração
a quem, drummondianamente, portando apenas duas mãos, carrega consigo o
sentimento do mundo e busca, com loucura, paixão e beleza, atingir “a síntese cosmogônica de tudo”.
JOSÉ MÁRIO DA SILVA
Foto de José Mário da Silva |
"O escritor, professor, e especialista em Língua Portuguesa e Literatura Brasileira pela Universidade Federal da Paraíba, José Mário da Silva, publicou vários ensaios na revista da Academia Brasileira de Letras e integrou também a coletânea de ensaios do livro “A Paraíba por si mesma”. Quanto à escrita, o autor “tem procurado consorciar a abordagem do texto literário já inserido no cânone da literatura brasileira, juntamente com as produções da contemporaneidade, por entender que a literatura é um sistema vivo e dinâmico”, declara José Mário da Silva."
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