1
Onde
estão os teus poetas
América
que
não cantam a verdadeira luz do dia
os
aéreos campos de toda a memória
os
jardins suspensos da beleza e da verdade
a
primavera de todas as estações?
Perderam-se
na fascinação noturna
na
contemplação da constelação do próprio umbigo
na
babel ultrapanorâmica do shopping das
vaidades
na
música ensurdecedora das máquinas de calcular
na
miragem sonâmbula dos efeitos coloridos do néon
na
viagem easy rider
dos sonhos pasteurizados
como
se a verdade fosse um chiclete de menta
salivada
no último poste do drugstore da
alma
Ah!
é necessário desligar todas as máquinas
para
que a consciência reaprenda a falar
e o ouvido se eduque à voz do coração!
2
De
que tipo de matéria é feita a ilusão?
De
que tipo de essência é a sua substância
para
eclipsar a inteligência de tão muitos
e
ofertar como luz o que na realidade é escuridão?
Quantos
véus será necessário desvelar
pra
que o olho interior possa avistar
o
espírito movendo-se na face das águas?
Percebes
(apenas) a brisa do ar-condicionado
mas
não sabes de onde sopra o espírito
nem
pra onde vai
Ginsberg
percebe a verdade
escreve
a “Ode Plutônica”
e
se converte ao Zen
Isso
é solar
Mas
Haroldo de Campos (e sua enteléquia)
traduz
“O Eclesiastes” e “A Cena da Origem”
e
não percebe o principal: a luz espiritual
Isso
é lunar
(Vide
Cabala Judaica à disposição
em
todas as bibliotecas
e
livrarias especializadas)
Porque
perdeste a inspiração
e
trans-piras por todos os poros
choras
como bezerro desmamado
e
o poema chega como overdose de nada
Vê:
Todas
as grandes obras
são
fruto da inspiração:
Gênesis
Tao Vedas Fausto
Dela
sabiam Rumi Attar e Kabir
no Oriente
Shakespeare
Dante e Goethe
no
Ocidente
Eles
sabiam beber na fonte
e
sua poesia nunca seca
Se
lhes é cara a verdade
meu
sofrimento tornou-a gratuita
Mirai-vos
em Baudelaire:
“—
É preciso embriagar-se de vinho
de
poesia e de virtudes”
E
em Rimbaud:
“—
A modernidade é o transitório
o
fugaz o contingente
a
metade da arte cuja metade
é
o eterno e imutável”
Era
líquido e certo:
(ah
o inefável poder da água)
eles
sabiam que havia algo mais
Mas
infelizmente não chegaram à fonte
Confundiram
o vinho místico de Khayam
com
o vinho fermentado das adegas de Montmartre
E
toda a eternidade
sempre
foi modernidade
Porque
é necessário que um poeta humilde
—
desses que cultivam a humildade
não
com devoção
mas
com drummondiano constrangimento —
nascido
(não em St. Louis)
mas
em São Luís do Maranhão
onde
o vento faz a curva
e
a ilha é parada , final
de
urubus e aviões
(daí
perceber de onde sopra o vento
e pra onde vai)
vos
dissesse essas verdades jupiterianas
como
conversa de pé de ouvido
entre
um corpo e outro corpo
entre
um espírito e outro espírito
3
Cansei
da tua noite América
Meus
pesadelos agora são diurnos
Minha
loucura é a paranoia dos ascetas
Minha
megalomania é a dos idiotas do eterno
Todas
as nuvens estão em meus cabelos
e
a lua foi digerida pelo sol da garganta
Todas
as viagens são para o centro
e
já posso divisar as estrelas e os cometas
no
movimento cósmico entre as veias e o sangue
Não
te exijo temas caros a poucos:
o
livre-arbítrio do homem
a
origem da vida
a
finalidade dos seres vivos
pois
nossos fusíveis sensíveis
poderiam
explodir ao contato de tanta luz
Troquei
a altura do Empire State
pela
minha consciência
e
o ideal do super-homem
pela
aspiração do justo
Não
mais o eterno retorno de Nietzsche
o
anel de núpcias com a eternidade
Quero
apenas a minha quota de luz
e
o descanso em algum lugar do azul!
4
Eu
quero a minha aura
escurecida na perda do amor pelo prazer
vilipendiada
pelo elogio do ressentimento
em
lugar do perdão
obscurecida
pela cobiça em vez do desapego
Eu
quero a minha aura
com
a liberdade do ser e não a prisão do ter
com
a humildade dos simples e não o orgulho dos tolos
com
a alegria do dar e não a melancolia do reter
Eu
quero a minha aura
ensanguentada
pelos crepúsculos
de
Dachau e Bombaim
purificada
pelo sabão da verdade
e
não o detergente da mentira
fragmentada
pelas ideologias de falsos
profetas
e poetas
Eu
quero a minha aura
prostituída
nos bordéis do materialismo e da solidão
apagada
no conflito nuclear entre o ser e o nada
trucidada
na guerra santa da falsa sabedoria
Eu
quero a minha aura
submetida
a cárcere privado pelo álcool e nicotina
estilhaçada
por megatons de ódio e temor
corrompida
pelo amargo pão dos tratados de paz
Eu
quero a minha aura
destruída
pela quimioterapia da ingaia ciência
anestesiada
pelos paraísos artificiais
que
me fizeram esquecer
que
sou parte integrante da natureza e da criação
Eu
quero a minha aura
viciada pelo ópio da tv e as falsas
mensagens de fraternidade
endurecida
pela arteriosclerose da egolatria
bombardeada
pelas guerras civis militares e eclesiásticas
em
nome de Deus mas financiadas pelo Diabo
Eu
quero a minha aura
aniquilada
pela angústia da perda da vontade
marcada
a ferro e fogo pelo napalm da culpa e do erro
crucificada
à direita entre as trevas e à esquerda a ilusão
Eu
quero a aura
eu
quero a aura
eu
quero a aura
resgatada
do lodo
de
toda ignorância
renascida
do pântano
de
toda sedução
ressurgida
pura e simples
como
o incêndio da beleza
nos
tempos em que o sol morava
no
coração
5
Lua
de Laforgue! Mallarmé Jorge Luís Borges!
Lilith
Juno e Hécate! Lua de Gurdjieff!
Lua
assassina de Maiakovski e Lorca!
18
Brumário da Racionalização!
Olho
mau do céu! Lua dândi de Frost!
Caranguejo
estelar! Karma dos
poetas!
Lua
de Marinetti Leopardi Walt Whitman!
Lua
neurótica de Pound! Lua na sarjeta
dos
boêmios de Montparnasse!
Sacerdotisa
da matéria!
Breviário
da inquisição da consciência!
Lua dadaísta-cubista-impressionista
de
todos os poetas vampirizados:
essa
é a tua última evocação!
A
partir de hoje
Fica
estabelecido
na
simbologia da criação
que
o sol é que é dos poetas
e
(agora) está completa
toda a operação do Sol!
Luís Augusto Cassas
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