terça-feira, 25 de março de 2014

A PELEJA DA SERPENTE E DA POMBA NO ESTÁDIO CÓSMICO LUZ E SOMBRA

OU A
DISCUSSÃO DA GRAÇA E DA ELETRICIDADE
NO QUINTAL BIFOCAL DA CLARIDADE





INTRODUÇÃO DA SERPENTE
AO LEITOR

Não sei por que às portas de Binah
fisgou-em a atração de Chochmah
trazendo no reflexo da quimera
o que do espelho brilha  a bela e a fera
Da pia batismal leia-me Nahash
e a outra a virgem a santa a  Shechinah
Eis afinal a verdadeira fábula
em que o mal e o bem lavam as velhas mágoas


A SERPENTE:

__ Dize lavanderia da esperteza:
por que o branco sendo a cor do puro
lavas a roupa diária intramuros
como se exorcizasses a tua pureza?
Tens a pálida neurose do sol
que a tudo encobre o claro lençol
A que vens: seduzir ou converter?
O fogo imortal queime-te o ser!


A POMBA:

__Desenrola o teu negro intelecto
permite desembarque o meu espírito
Enquanto te arrasta pelas urzes
solto velas brancas no céu em cruzes
Sou omo total  És petróleo bruto
Governa sobre nós o Absoluto
Tens a profundidade Eu a altura
Dissolve no veneno a amargura


A SERPENTE:

__Eu sou da luz a eletricidade:
o vapor a descarga a claridade!
Sustento há éons o fogo nas alturas
aquecendo o intelecto na noite escura
Todo progresso da ciência e a cura
oram por mim nos templos da usura
Vê: nem o dia escapa ao meu fascínio
às igrejas e shoppings ilumino!


A POMBA:

__Quem hasteou o sol na criação
e acendeu no homem o coração?
Quem deu à vida a contribuição
de tornar sábias a fé e a razão?
Sutil apreendeste a branca magia
tornando-a espessa por analogia
Do sol a sua total irradiação
converteste-o à nuclear fissão


A SERPENTE:

__ Reconheces a contraparte ativa
coagulada à natureza viva?
Decompus as estrelas em mil átomos
e fiz da explosão fiéis apóstolos
Na sombra da graça te movimentas
lançando-me dos créditos a descrença
Teu canto de cisne fere-me as luzes:
também o bem ao mal dispara obuses



A POMBA:

__ Quem paga a conta da humanidade:
a luz da graça ou a eletricidade?
A minha luz é pura e virtuosa
tornando as cinco chagas puras rosas
A recompensa ao bem que nada cobro
é o mal que a tua luz recebe em dobro
Mas o sol lançando às sutis esferas
irradia o prazer e o sol da guerra


A SERPENTE:

__ Por que metes o bico em meu zodíaco
se nem te sabem as penas os outros bichos?
Tua magia é pouca A voltagem fraca
Recarrega as baterias ora gastas
Ninguém chega ao céu senão por mim
faísca na verdade o estopim
Nas noites do Sinai ou Everest
resplandeço igual ao Empire State


A POMBA:

__ Brincas com o fogo e mal conheces a pólvora
gera a luz o mistério da palavra
A eletricidade é irmã do sexo
a força esgota em mortal amplexo
Oceânica a graça se espraia
multiplicando as marés da energia
O que proponho a ti é um novo pacto:
a abertura do círculo em um ato


A SERPENTE:

__ Se Deus for o Diabo e o Diabo for Deus?
E se o azul do céu for apenas breu?
Pode o cordeiro pastar com o leão
e voarem juntos perdiz e gavião?
No intrincado jogo das essências
pra que mudar a pele das aparências?
A tua presunção noiva é platônica:
envia flores para a bomba atômica!


A POMBA:

__ Rainha dos disfarces da alquimia
separa a técnica da sabedoria
Inverte o fluxo da polaridade
cooperando à nova gravidade
Permita que batize em fogo e água
os colaterais efeitos das tuas larvas
Compensa à graça a iluminação
furtada à energia da criação!


A SERPENTE:

__ Crismou-me tola e frágil a natureza:
rebelar-me não ouso à correnteza
Abandonar controle e constrição
frustrar seria a divina missão
Reabro o círculo e deponho a guarda
desde que bata as asas em retirada
Prudência cale a língua em água quente:
misericordiosas são as serpentes!


A POMBA:

__ Celebre a claridade o amor profundo
e o amor reate o espírito ao mundo!
Das obras do sol reaprende a lição
libertar das trevas o coração
Crucifica a vontade de poder
e ressuscita a vontade de ser
Se no jardim à flor protege-lhe o espinho
o mal é sempre um bem vindo a caminho



CONCLUSÃO DA POMBA

__ Debaixo do teu suntuoso couro
plantou-te o criador belo tesouro
Quanto a mim pássaro de fino agouro
o que reluz em mim é a flor do ouro
Quer vistamos tentáculos ou asas
somos figuras da magia sagrada
Na vida real ou em contos de fadas
dirige a obra a bem aventurada




Luís Augusto Cassas
In A Poesia Sou Eu, vol. 2, p. 534



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