sexta-feira, 22 de agosto de 2014

T (O FILHO PRÓDIGO: UM POEMA DE LUZ E SOMBRA)





Órfão de mim e sozinho
então tomei meu menino
apertei-o contra o peito
lambuzei-lhe par de beijos
cabelos acariciei-os
ombro a ombro embalei-o 
(arco-íris expulsando escombros
irrompendo à terra o veio)
desfiz-lhe o nó na garganta
cera lavei-lhe dos olhos
acendi-lhe o sol no seio
sequei-lhe a fonte de mágoa
clamando à dor o despejo
sob proteção dos afagos
dissolvi-lhe o sal amargo
sentindo que a frágil criança
transformava-se contrafeito
não em embevecido infante
mas em ancião satisfeito
aquele que em densa névoa
ressuscitou-me do leito
encaixando-me as suas pernas
para um caminho refeito
amparando as minhas quedas
guiando-me a novo berço
Como não ouvir o estampido
de dois peitos comprimidos
boi e bezerro em mil lambidos
derramando os seus vagidos?
O velho e o menino
o menino e o velho
cumprem o seu destino
nos mesmos artelhos
Abraçado à velha árvore
senti no tronco o temor
novos ritos de passagem
antecipação da flor
Descascando velhas mágoas
de enclausuradas cebolas
serpentes tornadas lágrimas
transmutam-se em alvas rolas
Do pranto meu lave o Rei
os pés feridos em alcatrazes:
Pai não te deixarei
enquanto não me abençoares
Ó horas de viver
ó horas de morrer
conciliou-me o ser:
morrer e renascer
Já não sou eu quem vive
é o pai que em mim revive
Já não sou mais eu quem chora
é o pai que em mim ora


( - faz a suma correção
inverte a inércia em ação:
nove meses no mundo
três meses no fundo

sê mensageiro do verde
refloresce a tua família
sê como filho à tua filha
a todos abastece a sede

ulisses em retorno à ilha
recupera a alta magia
torna as feridas em espigas
junta ao trabalho a alegria

ergue-te ó fênix das sobras
planta o sol em tua casa
concedo-te poder  e honra
pra concluíres tua obra)








Luís Augusto Cassas
In A Poesia Sou Eu, vol. 2, p. 398




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